VAMOS FALAR DE PIMENTAS?
Segue (o resumo da) discussão sobre esse frutinho delicioso e picante, nativo de Abya Yala e que permeia diversas culturas indígenas, não só como alimento, mas algo de extremo valor espiritual, nutricional e cultural
Primeiro de tudo, vamos diferenciar os termos porque em português-brasileiro pode referir-se tanto às espécies do gênero Capsicum (as que vamos abordar neste tópico) como as do gênero Piper (ex. pimenta-do-reino, pimenta-preta) e do gênero Pimenta (ex. pimenta-da-Jamaica).
Em espanhol há muitos termos para a nossa pimenta nativa Capsicum , como pimiento , chile, ají, axí ou guindilla … E as pimentas do gênero Piper que são mais conhecidas como pimienta ou guindillo-de-Índia.
Os moedores com pimenta-preta que europeus usavam contém piperina, em pequena quantidade.
O spray de pimenta é feito a partir da herança da capsaicina, encontrada nas pimentas do gênero Capsicum só após séculos da invasão de Colombo.
Por que é importante entender a diferença?
Porque, por muitas vezes, é de senso comum associarmos pimenta à gastrite, úlcera, inflamações intestinais, hemorroidas… Quem nunca ouviu piada sobre “arder pra entrar e pra sair”?
As pimentas Capsicum não causam problemas gastrointestinais. Elas contém capsaicina , aceleram o metabolismo, são antioxidantes, fonte de vitaminas C e E, potássio, fósforo, é antibiótica, anticancerígena e analgésica.
Leia mais no artigo, em inglês: Capsicum annuum (pimenta): Uma antiga cultura latino-americana com excelentes compostos bioativos e potencial nutracêutico.
Se você já tem uma inflamação nunca se deve exagerar com qualquer alimento, até pq normalmente acompanham outros temperos, como vinagre, sal etc, mas a ideia de que essa pimenta causa hemorroida, apesar de bastante difundida, é falsa.
Pimenta é antioxidante e libera endorfina; veja 5 benefícios do alimento
A pimenta-do-reino é um tipo que se deve evitar o consumo exagerado. Esse fruto contém piperina , e quando usado moído, penetra com mais facilidade nas paredes intestinais e na corrente sanguínea, podendo entupir artérias, causando hemorroidas.
A pimenta é uma riqueza!
E quem já sabia disso? Os povos indígenas!
A pimenta surgiu na região do Alto Peru, que inclui a bacia do Lago Titicaca, no território onde hoje é a Bolívia, segundo diversos estudos paleobotânicos que analisaram o DNA vegetal das espécies.
Surgiu na região mesoandina, nos vales da região de Cochabamba e Chuquisaca. O botânico W. Hardy Eshbaugh, professor na Universidade de Miami, encontrou nos anos 70 a semente silvestre mãe de todas as pimentas.
Lhes apresento a ULUPICA ( Capsicum cardenasii ):
Rita del Solar e Lupe Andrade, fizeram um estudo cuidadoo das pesquisas de Eshbaugh e publicaram a história no livro Ají, regalo de Bolívia al mundo (Pimenta, presente da Bolívia para o mundo), ainda sem tradução em português.
A ulupica (palavra de origem quíchua) surgiu cerca de 10 mil anos atrás, e até hoje é usada com tomate no preparo da llajua, o famoso molho picante andino. Entretanto, não é plantada em larga escala, apenas em hortas familiares, continuando a ser considerada um fruto silvestre.
CURIOSIDADE: Sabe quem amava pimenta? Che Guevara!
Ele comia bastante pimenta para aliviar suas crises de asma.
Sua última janta antes de ser capturada e assassinada foi um prato de sopa de maní (sopa de amendoim) com llajua, em La Higuera, na Bolívia.
São importantes pra diversos povos nativos, e se até hoje há este traje de comer pimenta, devemos a herança das culturas indígenas, que domesticaram várias espécies através dos séculos. Lembra que falei dos nomes da pimenta em espanhol?
30 formas distintas de chamar a los pimientos
A palavra “chile” para definir as pimentas vem do Náhuatl xilli, idioma dos povos astecas, e é muito utilizada no México atual, sul dos EUA e países da mesoamérica para se referir a pimenta. Nada a ver com Chile ok?
Sabe aquele prato apimentado, chili? O nome vem daí.
Os astecas tinham armas bastante sofisticadas, uma delas foi documentada em História Geral das Coisas da Nova Espanha , escrita por frei Sahagún.
A fumaça das malaguetas jogadas no fogo foi usada como gases lacrimogêneos são usados hoje.
A pimenta tinha valor espiritual. Segundo Sahagún, no festival Huey Tozoztli, a deusa Chicomecóatl recebeu várias ofertas com alimentos, incluindo pimenta.
Na imagem, ao lado de duas espigas de milho, à esquerda dos pés de Chicomecóatl, há uma caixa com pimentas.
Já as palavras ají e axí vem do tronco arawak, do idioma dos povos Taíno das Antilhas, os primeiros a ter contato com Colombo, que chegou à ilha La Hispaniola, hoje atual Haiti e Rep. Dominicana. Conheceu a Capsicum annumm , espécie de pimentão, com mts variedades.
O frei Bartolomé de las Casas escreveu:
“Tinha muito algodão ali, […]muita mástique, […] tem também muito axí, que é a sua pimenta, que vale mais que a pimenta (a preta), e todos não comem sem, acho muito saudável: podem carregar 50 caravelas por ano naquela Española.”
No documentário feito pelo canal Trece Colombia, Ají, Plantas de Poder , vemos o povo Kubeo, que habitam a atual Colômbia e também o norte do Brasil, falando sobre a importância da pimenta na cosmovisão deles.
E para os povos andinos não é diferente. A pimenta é tão presente na nossa culinária, que tem registros em cerâmicas pré-colombianas. Essa cerâmica Nazca já tinha desenhos de pimenta, de cerca de 200 AEC (Museu Larco – Lima, Peru).
Muitas obras de povos andinos dos períodos Nazca, Moche, Paracas, Incaico entre outros estão disponíveis na galeria online do site do Museu Larco. Aqui vemos três esculturas onde a pimenta é representada. Visitem o Museu Larco !
Cieza de León, escreveu, sobre a importância da pimenta para os povos andinos:
“E para celebrar o Inti Raymi com maior devoção e solenidade, jejuaram 10 ou 12 dias abstendo-se de comer, e não dormir com suas esposas […]; e não comem pimenta nem trazem coca na boca […]”.
Em quíchua, pimenta é uchu, mesmo assim é bastante comum nos países andinos chamá-la de ají, influência dos comerciantes espanhóis. O nome uchu figura em vários pratos da culinária andina, como em Chiriuchu, Cariucho, Uchujacu, Fideos Uchu, pratos maravilhosos.
Durante o período do Império Incaico, a pimenta também foi utilizada como arma e como moeda de troca, o chamado rantii, descrito no livro Ajíes peruanos, sazón para el mundo (Pimentas peruanas, tempero para o mundo), ainda sem tradução.
Nativas dos Andes, a mais comum é a locoto ( Capsicum pubescens ), uma espécie que parece uma maçã, e possui sementes pretas. Atualmente é o mais utilizado no preparo da llajua e outros pratos pois é mais comum de encontrar, já que é produzido em larga escala.
A capsaicina é o que faz a pimenta arder, certo? A capsaicina está concentrada principalmente na placenta da pimenta, aquela membrana de cores mais clara que une as sementes à polpa. Agora, um pouquinho de anatomia, pra entenderem:
As sementes ficam grudadas na placenta, por isso muita gente acha que elas fazem arder. Pra arder menos, é só abrir e remover a placenta com uma faca afiada. E não adianta tomar água, a capsaicina é lipossolúvel, ou seja, solúvel em óleo. Não aguenta? Bebe leite!
O gênero Capsicum é pertencente à família Solanaceae, principalmente à família Silva das plantas, abrigando diversos alimentos, como beringela, jiló, tomate…
Composto por cerca de 30 espécies, apenas 5 são domesticadas de fato, com algumas variedades entre si de ardência.
Aqui alguns exemplos comuns:
- annumm (pimentão, jalapeño, páprica)
- baccatum (dedo-de-moça, ají, cumari, cambuci)
- chinense (biquinho, bode, habanero)
- frutescens (malagueta)
- pubescens (locoto, pimenta-maçã)
Dicas de plantio que funcionam para diversas espécies:
Plante em ambientes quentes, é uma planta tropical
Quanto mais sol, melhor!
Mantenha o solo úmido, cubra com folhas, cascatas, serragem
Poda regular, ajuda na renovação foliar
Solo fértil, bastante adubação, pH neutro
As folhas também são comestíveis! Podem ser usados em chás, refogadas, na sopa e em saladas, além de servir como remédios em unguentos, pastas, pomadas para tratar furúnculos, artrites, etc.
Por enquanto isso é quase tudo, mas poderia falar horas a fio sobre pimenta!
AH, AINDA EM TEMPO. Lembrem-se de uma coisa: não existiriam essas variedades se não fosse o conhecimento indígena de agricultura que atravessou séculos mesmo com a colonização. Agradeça aos indígenas, sobretudo hoje, por ter tantos sabores no seu prato.
VAMOS FALAR DE PIMENTAS? Segue (o resumo da) discussão sobre esse frutinho delicioso e picante, nativo de Abya Yala e que permeia diversas culturas indígenas, não só como alimento, mas algo de extremo valor espiritual, nutricional e cultural
Primeiro de tudo, vamos diferenciar os termos porque em português-brasileiro pode referir-se tanto às espécies do gênero Capsicum (as que vamos abordar neste tópico) como as do gênero Piper (ex. pimenta-do-reino, pimenta-preta) e do gênero Pimenta (ex. pimenta-da-Jamaica).
Em espanhol há muitos termos para a nossa pimenta nativa Capsicum , como pimiento , chile, ají, axí ou guindilla … E as pimentas do gênero Piper que são mais conhecidas como pimienta ou guindillo-de-Índia .
Os moedores com pimenta-preta que europeus usavam contém piperina, em pequena quantidade.
O spray de pimenta é feito a partir da herança da capsaicina, encontrada nas pimentas do gênero Capsicum só após séculos da invasão de Colombo.
Por que é importante entender a diferença?
Porque, por muitas vezes, é de senso comum associarmos pimenta à gastrite, úlcera, inflamações intestinais, hemorroidas… Quem nunca ouviu piada sobre “arder pra entrar e pra sair”?
As pimentas Capsicum não causam problemas gastrointestinais. Elas contém capsaicina , aceleram o metabolismo, são antioxidantes, fonte de vitaminas C e E, potássio, fósforo, é antibiótica, anticancerígena e analgésica.
Leia mais no artigo, em inglês: Capsicum annuum (pimenta): Uma antiga cultura latino-americana com excelentes compostos bioativos e potencial nutracêutico.
Se você já tem uma inflamação nunca se deve exagerar com qualquer alimento, até pq normalmente acompanham outros temperos, como vinagre, sal etc, mas a ideia de que essa pimenta causa hemorroida, apesar de bastante difundida, é falsa.
Pimenta é antioxidante e libera endorfina; veja 5 benefícios do alimento
A pimenta-do-reino é um tipo que se deve evitar o consumo exagerado. Esse fruto contém piperina , e quando usado moído, penetra com mais facilidade nas paredes intestinais e na corrente sanguínea, podendo entupir artérias, causando hemorroidas.
A pimenta é uma riqueza!
E quem já sabia disso? Os povos indígenas!
A pimenta surgiu na região do Alto Peru, que inclui a bacia do Lago Titicaca, no território onde hoje é a Bolívia, segundo diversos estudos paleobotânicos que analisaram o DNA vegetal das espécies.
Surgiu na região mesoandina, nos vales da região de Cochabamba e Chuquisaca. O botânico W. Hardy Eshbaugh, professor na Universidade de Miami, encontrou nos anos 70 a semente silvestre mãe de todas as pimentas.
Lhes apresento a ULUPICA ( Capsicum cardenasii ):
Rita del Solar e Lupe Andrade, fizeram um estudo cuidadoo das pesquisas de Eshbaugh e publicaram a história no livro Ají, regalo de Bolívia al mundo (Pimenta, presente da Bolívia para o mundo), ainda sem tradução em português.
A ulupica (palavra de origem quíchua) surgiu cerca de 10 mil anos atrás, e até hoje é usada com tomate no preparo da llajua, o famoso molho picante andino. Entretanto, não é plantada em larga escala, apenas em hortas familiares, continuando a ser considerada um fruto silvestre.
CURIOSIDADE: Sabe quem amava pimenta? Che Guevara!
Ele comia bastante pimenta para aliviar suas crises de asma.
Sua última janta antes de ser capturada e assassinada foi um prato de sopa de maní (sopa de amendoim) com llajua, em La Higuera, na Bolívia.
São importantes pra diversos povos nativos, e se até hoje há este traje de comer pimenta, devemos a herança das culturas indígenas, que domesticaram várias espécies através dos séculos. Lembra que falei dos nomes da pimenta em espanhol?
30 formas distintas de chamar a los pimientos
A palavra “chile” para definir as pimentas vem do Náhuatl xilli, idioma dos povos astecas, e é muito utilizada no México atual, sul dos EUA e países da mesoamérica para se referir a pimenta. Nada a ver com Chile ok?
Sabe aquele prato apimentado, chili? O nome vem daí.
Os astecas tinham armas bastante sofisticadas, uma delas foi documentada em História Geral das Coisas da Nova Espanha , escrita por frei Sahagún.
A fumaça das malaguetas jogadas no fogo foi usada como gases lacrimogêneos são usados hoje.
A pimenta tinha valor espiritual. Segundo Sahagún, no festival Huey Tozoztli, a deusa Chicomecóatl recebeu várias ofertas com alimentos, incluindo pimenta.
Na imagem, ao lado de duas espigas de milho, à esquerda dos pés de Chicomecóatl, há uma caixa com pimentas.
Já as palavras ají e axí vem do tronco arawak, do idioma dos povos Taíno das Antilhas, os primeiros a ter contato com Colombo, que chegou à ilha La Hispaniola, hoje atual Haiti e Rep. Dominicana. Conheceu a Capsicum annumm , espécie de pimentão, com mts variedades.
O frei Bartolomé de las Casas escreveu:
“Tinha muito algodão ali, […]muita mástique, […] tem também muito axí, que é a sua pimenta, que vale mais que a pimenta (a preta), e todos não comem sem, acho muito saudável: podem carregar 50 caravelas por ano naquela Española.”
No documentário feito pelo canal Trece Colombia, Ají, Plantas de Poder , vemos o povo Kubeo, que habitam a atual Colômbia e também o norte do Brasil, falando sobre a importância da pimenta na cosmovisão deles.
E para os povos andinos não é diferente. A pimenta é tão presente na nossa culinária, que tem registros em cerâmicas pré-colombianas. Essa cerâmica Nazca já tinha desenhos de pimenta, de cerca de 200 AEC (Museu Larco – Lima, Peru).
Muitas obras de povos andinos dos períodos Nazca, Moche, Paracas, Incaico entre outros estão disponíveis na galeria online do site do Museu Larco. Aqui vemos três esculturas onde a pimenta é representada. Visitem o Museu Larco !
Cieza de León, escreveu, sobre a importância da pimenta para os povos andinos:
“E para celebrar o Inti Raymi com maior devoção e solenidade, jejuaram 10 ou 12 dias abstendo-se de comer, e não dormir com suas esposas […]; e não comem pimenta nem trazem coca na boca […]”.
Em quíchua, pimenta é uchu, mesmo assim é bastante comum nos países andinos chamá-la de ají, influência dos comerciantes espanhóis. O nome uchu figura em vários pratos da culinária andina, como em Chiriuchu, Cariucho, Uchujacu, Fideos Uchu, pratos maravilhosos.
Chiri Uchu é o prato tradicional da cidade de Cusco que significa “pimenta fria” ou “picante frio” em quechua. Este prato é da época do Império Incaico e da colônia, combina do altiplano peruano, da costa e da selva, que o torna o prato estrela da culinária de Cusco, composto por algas, ovo, cuy (porquinho-da-índia), frango, charque (carne seca), chouriço (morcilla), batata, milho, queijo e locoto.
O cariucho na verdade, é uma guarnição, que pode ser consumida como prato principal. Pode ser uma batata grande cozida ou fatias de batata e molho de amendoim, servida com alface, ovo cozido e talvez tomate. Você também pode ter fatias de cebola. Pode acompanhar cuy (porquinho-da-índia), cortes de frango e carnes fritas.
Uchu Jacu, “farinha picante“ em quechua, na verdade é uma farinha tradicional de seis grãos ou mais que forma uma sopa muito tradicional da região de Cayambe, no norte da província equatoriana de Pichincha.
O ají de fideo ou mais conhecido como macarrão uchu (fideo uchu) é um prato muito original do vale boliviano, é um prato que, quem sabe preparar, se encontra diariamente nas feiras de alimentos. O seu sabor e picante incomparáveis fazem deste prato um dos mais desejados, principalmente às quintas-feiras, tem como base macarrão, batata, carne de boi ou frango picado ou alguma variante, com vegetais como ervilha, feijão e por fim decoram um pouco de salsa picada.
Lembra que eu falei do famoso molho picante andino, a llajua?
Durante o período do Império Incaico, a pimenta também foi utilizada como arma e como moeda de troca, o chamado rantii, descrito no livro Ajíes peruanos, sazón para el mundo (Pimentas peruanas, tempero para o mundo), ainda sem tradução.
Nativas dos Andes, a mais comum é a locoto ( Capsicum pubescens ), uma espécie que parece uma maçã, e possui sementes pretas. Atualmente é o mais utilizado no preparo da llajua e outros pratos pois é mais comum de encontrar, já que é produzido em larga escala.
A capsaicina é o que faz a pimenta arder, certo? A capsaicina está concentrada principalmente na placenta da pimenta, aquela membrana de cores mais clara que une as sementes à polpa. Agora, um pouquinho de anatomia, pra entenderem:
As sementes ficam grudadas na placenta, por isso muita gente acha que elas fazem arder. Pra arder menos, é só abrir e remover a placenta com uma faca afiada. E não adianta tomar água, a capsaicina é lipossolúvel, ou seja, solúvel em óleo. Não aguenta? Bebé leite!
O gênero Capsicum é pertencente à família Solanaceae, principalmente à família Silva das plantas, abrigando diversos alimentos, como beringela, jiló, tomate…
Composto por cerca de 30 espécies, apenas 5 são domesticadas de fato, com algumas variedades entre si de ardência.
Aqui alguns exemplos comuns:
- annumm (pimentão, jalapeño, páprica)
- baccatum (dedo-de-moça, ají, cumari, cambuci)
- chinense (biquinho, bode, habanero)
- frutescens (malagueta)
- pubescens (locoto, pimenta-maçã)
Dicas de plantio que funcionam para diversas espécies:
Plante em ambientes quentes, é uma planta tropical
Quanto mais sol, melhor!
Mantenha o solo úmido, cubra com folhas, cascatas, serragem
Poda regular, ajuda na renovação foliar
Solo fértil, bastante adubação, pH neutro
As folhas também são comestíveis! Podem ser usados em chás, refogadas, na sopa e em saladas, além de servir como remédios em unguentos, pastas, pomadas para tratar furúnculos, artrites, etc.
Por enquanto isso é quase tudo, mas poderia falar horas a fio sobre pimenta!
AH, AINDA EM TEMPO. Lembrem-se de uma coisa: não existiriam essas variedades se não fosse o conhecimento indígena de agricultura que atravessou séculos mesmo com a colonização. Agradeça aos indígenas, sobretudo hoje, por ter tantos sabores no seu prato.
VAMOS FALAR DE PIMENTAS? Segue (o resumo da) discussão sobre esse frutinho delicioso e picante, nativo de Abya Yala e que permeia diversas culturas indígenas, não só como alimento, mas algo de extremo valor espiritual, nutricional e cultural
Primeiro de tudo, vamos diferenciar os termos porque em português-brasileiro pode referir-se tanto às espécies do gênero Capsicum (as que vamos abordar neste tópico) como as do gênero Piper (ex. pimenta-do-reino, pimenta-preta) e do gênero Pimenta (ex. pimenta-da-Jamaica).
Em espanhol há muitos termos para a nossa pimenta nativa Capsicum , como pimiento , chile, ají, axí ou guindilla … E as pimentas do gênero Piper que são mais conhecidas como pimienta ou guindillo-de-Índia .
OFF: Aquele meme do Shrek tá errado.
Os moedores com pimenta-preta que europeus usavam contém piperina, em pequena quantidade.
O spray de pimenta é feito a partir da herança da capsaicina, encontrada nas pimentas do gênero Capsicum só após séculos da invasão de Colombo.
Por que é importante entender a diferença?
Porque, por muitas vezes, é de senso comum associarmos pimenta à gastrite, úlcera, inflamações intestinais, hemorroidas… Quem nunca ouviu piada sobre “arder pra entrar e pra sair”?
As pimentas Capsicum não causam problemas gastrointestinais. Elas contém capsaicina , aceleram o metabolismo, são antioxidantes, fonte de vitaminas C e E, potássio, fósforo, é antibiótica, anticancerígena e analgésica.
Leia mais no artigo, em inglês: Capsicum annuum (pimenta): Uma antiga cultura latino-americana com excelentes compostos bioativos e potencial nutracêutico.
Se você já tem uma inflamação nunca se deve exagerar com qualquer alimento, até pq normalmente acompanham outros temperos, como vinagre, sal etc, mas a ideia de que essa pimenta causa hemorroida, apesar de bastante difundida, é falsa.
Pimenta é antioxidante e libera endorfina; veja 5 benefícios do alimento
A pimenta-do-reino é um tipo que se deve evitar o consumo exagerado. Esse fruto contém piperina , e quando usado moído, penetra com mais facilidade nas paredes intestinais e na corrente sanguínea, podendo entupir artérias, causando hemorroidas.
A pimenta é uma riqueza!
E quem já sabia disso? Os povos indígenas!
A pimenta surgiu na região do Alto Peru, que inclui a bacia do Lago Titicaca, no território onde hoje é a Bolívia, segundo diversos estudos paleobotânicos que analisaram o DNA vegetal das espécies.
Surgiu na região mesoandina, nos vales da região de Cochabamba e Chuquisaca. O botânico W. Hardy Eshbaugh, professor na Universidade de Miami, encontrou nos anos 70 a semente silvestre mãe de todas as pimentas.
Lhes apresento a ULUPICA ( Capsicum cardenasii ):
Rita del Solar e Lupe Andrade, fizeram um estudo cuidadoo das pesquisas de Eshbaugh e publicaram a história no livro Ají, regalo de Bolívia al mundo (Pimenta, presente da Bolívia para o mundo), ainda sem tradução em português.
A ulupica (palavra de origem quíchua) surgiu cerca de 10 mil anos atrás, e até hoje é usada com tomate no preparo da llajua, o famoso molho picante andino. Entretanto, não é plantada em larga escala, apenas em hortas familiares, continuando a ser considerada um fruto silvestre.
CURIOSIDADE: Sabe quem amava pimenta? Che Guevara!
Ele comia bastante pimenta para aliviar suas crises de asma.
Sua última janta antes de ser capturada e assassinada foi um prato de sopa de maní (sopa de amendoim) com llajua, em La Higuera, na Bolívia.
São importantes pra diversos povos nativos, e se até hoje há este traje de comer pimenta, devemos a herança das culturas indígenas, que domesticaram várias espécies através dos séculos. Lembra que falei dos nomes da pimenta em espanhol?
30 formas distintas de chamar a los pimientos
A palavra “chile” para definir as pimentas vem do Náhuatl xilli, idioma dos povos astecas, e é muito utilizada no México atual, sul dos EUA e países da mesoamérica para se referir a pimenta. Nada a ver com Chile ok?
Sabe aquele prato apimentado, chili? O nome vem daí.
Os astecas tinham armas bastante sofisticadas, uma delas foi documentada em História Geral das Coisas da Nova Espanha , escrita por frei Sahagún.
A fumaça das malaguetas jogadas no fogo foi usada como gases lacrimogêneos são usados hoje.
A pimenta tinha valor espiritual. Segundo Sahagún, no festival Huey Tozoztli, a deusa Chicomecóatl recebeu várias ofertas com alimentos, incluindo pimenta.
Na imagem, ao lado de duas espigas de milho, à esquerda dos pés de Chicomecóatl, há uma caixa com pimentas.
Já as palavras ají e axí vem do tronco arawak, do idioma dos povos Taíno das Antilhas, os primeiros a ter contato com Colombo, que chegou à ilha La Hispaniola, hoje atual Haiti e Rep. Dominicana. Conheceu a Capsicum annumm , espécie de pimentão, com mts variedades.
O frei Bartolomé de las Casas escreveu:
“Tinha muito algodão ali, […]muita mástique, […] tem também muito axí, que é a sua pimenta, que vale mais que a pimenta (a preta), e todos não comem sem, acho muito saudável: podem carregar 50 caravelas por ano naquela Española.”
No documentário feito pelo canal Trece Colombia, Ají, Plantas de Poder , vemos o povo Kubeo, que habitam a atual Colômbia e também o norte do Brasil, falando sobre a importância da pimenta na cosmovisão deles.
E para os povos andinos não é diferente. A pimenta é tão presente na nossa culinária, que tem registros em cerâmicas pré-colombianas. Essa cerâmica Nazca já tinha desenhos de pimenta, de cerca de 200 AEC (Museu Larco – Lima, Peru).
Muitas obras de povos andinos dos períodos Nazca, Moche, Paracas, Incaico entre outros estão disponíveis na galeria online do site do Museu Larco. Aqui vemos três esculturas onde a pimenta é representada. Visitem o Museu Larco !
Cieza de León, escreveu, sobre a importância da pimenta para os povos andinos:
“E para celebrar o Inti Raymi com maior devoção e solenidade, jejuaram 10 ou 12 dias abstendo-se de comer, e não dormir com suas esposas […]; e não comem pimenta nem trazem coca na boca […]”.
Em quíchua, pimenta é uchu, mesmo assim é bastante comum nos países andinos chamá-la de ají, influência dos comerciantes espanhóis. O nome uchu figura em vários pratos da culinária andina, como em Chiriuchu, Cariucho, Uchujacu, Fideos Uchu, pratos maravilhosos.
Chiri Uchu é o prato tradicional da cidade de Cusco que significa “pimenta fria” ou “picante frio” em quechua. Este prato é da época do Império Incaico e da colônia, combina do altiplano peruano, da costa e da selva, que o torna o prato estrela da culinária de Cusco, composto por algas, ovo, cuy (porquinho-da-índia), frango, charque (carne seca), chouriço (morcilla), batata, milho, queijo e locoto.
O cariucho na verdade, é uma guarnição, que pode ser consumida como prato principal. Pode ser uma batata grande cozida ou fatias de batata e molho de amendoim, servida com alface, ovo cozido e talvez tomate. Você também pode ter fatias de cebola. Pode acompanhar cuy (porquinho-da-índia), cortes de frango e carnes fritas.
Uchu Jacu, “farinha picante“ em quechua, na verdade é uma farinha tradicional de seis grãos ou mais que forma uma sopa muito tradicional da região de Cayambe, no norte da província equatoriana de Pichincha.
O ají de fideo ou mais conhecido como macarrão uchu (fideo uchu) é um prato muito original do vale boliviano, é um prato que, quem sabe preparar, se encontra diariamente nas feiras de alimentos. O seu sabor e picante incomparáveis fazem deste prato um dos mais desejados, principalmente às quintas-feiras, tem como base macarrão, batata, carne de boi ou frango picado ou alguma variante, com vegetais como ervilha, feijão e por fim decoram um pouco de salsa picada.
Lembra que eu falei do famoso molho picante andino, a llajua?
Durante o período do Império Incaico, a pimenta também foi utilizada como arma e como moeda de troca, o chamado rantii, descrito no livro Ajíes peruanos, sazón para el mundo (Pimentas peruanas, tempero para o mundo), ainda sem tradução.
Nativas dos Andes, a mais comum é a locoto ( Capsicum pubescens ), uma espécie que parece uma maçã, e possui sementes pretas. Atualmente é o mais utilizado no preparo da llajua e outros pratos pois é mais comum de encontrar, já que é produzido em larga escala.
A capsaicina é o que faz a pimenta arder, certo? A capsaicina está concentrada principalmente na placenta da pimenta, aquela membrana de cores mais clara que une as sementes à polpa. Agora, um pouquinho de anatomia, pra entenderem:
As sementes ficam grudadas na placenta, por isso muita gente acha que elas fazem arder. Pra arder menos, é só abrir e remover a placenta com uma faca afiada. E não adianta tomar água, a capsaicina é lipossolúvel, ou seja, solúvel em óleo. Não aguenta? Bebé leite!
O gênero Capsicum é pertencente à família Solanaceae, principalmente à família Silva das plantas, abrigando diversos alimentos, como beringela, jiló, tomate…
Composto por cerca de 30 espécies, apenas 5 são domesticadas de fato, com algumas variedades entre si de ardência.
Aqui alguns exemplos comuns:
- annumm (pimentão, jalapeño, páprica)
- baccatum (dedo-de-moça, ají, cumari, cambuci)
- chinense (biquinho, bode, habanero)
- frutescens (malagueta)
- pubescens (locoto, pimenta-maçã)
Dicas de plantio que funcionam para diversas espécies:
Plante em ambientes quentes, é uma planta tropical
Quanto mais sol, melhor!
Mantenha o solo úmido, cubra com folhas, cascatas, serragem
Poda regular, ajuda na renovação foliar
Solo fértil, bastante adubação, pH neutro
As folhas também são comestíveis! Podem ser usados em chás, refogadas, na sopa e em saladas, além de servir como remédios em unguentos, pastas, pomadas para tratar furúnculos, artrites, etc.
Por enquanto isso é quase tudo, mas poderia falar horas a fio sobre pimenta!
AH, AINDA EM TEMPO. Lembrem-se de uma coisa: não existiriam essas variedades se não fosse o conhecimento indígena de agricultura que atravessou séculos mesmo com a colonização. Agradeça aos indígenas, sobretudo hoje, por ter tantos sabores no seu prato.
Fonte: Juliana Padilha